quarta-feira, 28 de julho de 2021

ALVORADA MUSICAL NO SOBRADO DO BARÃO



"Conhecer Icó para mim foi um deslumbramento. Aqueles sobrados foram uma grande visão do barroco-sertanejo. Fiquei encantado. Icó não perde nem para os belos prédios de Minas Gerais, nem pra ninguém".

(Ariano Suassuna, escritor e romancista).

O local por si só já inspira saudosismo, recordações, um retorno histórico à vida da cidade banhada pelo Rio Salgado. O sobrado do Barão faz parte do acervo do patrimônio histórico do Ceará e ali morou um avarento capitalista da época.

Coube ao Seu Joaquim Ferreira da Silva, telegrafista aposentado dos Correios e Telégrafos, onde atuou por muitos anos digitando o “Código Morse” na agência local, a primazia de adquirir o imóvel, conservá-lo e residir com a sua família desde épocas remotas.

Localização privilegiada por situar-se na cortina da beleza arquitetônica que a cidade oferece, tendo por vizinhança uma parte deste acervo mais cobiçado:

- Igreja Senhor do Bonfim, Teatro da Ribeira dos Icós e Cadeia Pública, além do imóvel ser divisor de três grandes artérias: rua larga; rua das almas e rua do velame, portanto, ideal para contemplar a beleza das suas edificações.

O que diria o jurista icoense Fabrício Moreira, cognominado "Guardião do Largo do Théberge", freqüentador assíduo no “happy hour” do famoso Rui Barbosa no andar térreo do Sobrado do Barão, sempre no final da tarde, estes encontros ajudam a criar um ambiente descontraído e menos formal entre os colegas.

Seu Ferreira praticava o conceito do bom entretenimento, com o hábito de acordar cedo e já nas madrugadas ligar a vitrola em alto volume, que pelo silêncio reinante na pacata cidade, nas décadas de 1960 e 1970, a propagação poderia ser captada em outras ruas mais distantes.

Quem gostasse de alvorada musical e mais especificamente de ouvir dos discos de cera (LP de vinil) a voz dos saudosos cantores que marcaram épocas na vida artística nacional tinha essa rara oportunidade, como o Seu Chico Moreira, que doou muitos LP’s para a coleção bucólica do telegrafista e ficava atento à seleção de melodias tocadas.

Era uma saudosa diversão ouvir as músicas de vanguarda, precisando para tal, deixar ser vencido com as notas musicais levadas e acordar mais cedo para constatar que existiram poetas e músicos que gravaram composições que até hoje ainda comove as novas gerações.

Diz o poeta: "Eu sonho com um passado, distante daqui, onde os anos são dourados, sonhados e valvulados; Eu preciso voltar, pro tempo em que eu não vivi, como uma velha vitrola, que voltasse a tocar antigas recordações, onde eu queria estar; Eu preciso voltar, pro tempo em que eu não vivi”.

Lembrando, também, o refrão “recordar é viver” da introdução de uma belíssima marchinha de Carnaval dos tempos de outrora.

A magia da música e a mensagem da letra levam às nossas almas a possibilidade de voltar ao passado e reviver todas as possíveis situações do pretérito.

Por outro lado, há as doces reminiscências dos momentos mais inusitados que o Seu Ferreira do Sobrado do Barão fazia questão de externar.

(Por Gilson Moreira – escritor, contador de causos, membro da Academia de Letras ALMECE(extraído do livro “Fatos Pitorescos da Ribeira dos Icós e outras Ribeiras”).

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