O conhecidíssimo carcereiro da cadeia pública do Icó, o Cizota – Francisco Cizota Tavares, profissão herdada do pai, exerceu as suas atividades profissionais quando a casa de detenção ou xilindró funcionava no monumental prédio histórico, construído entre 1857 e 1861, pelo governador João de Tefé, a Casa da Câmara e Cadeia do Icó.
Notabilizou-se pelos seus discursos inflamados num palavreado próprio, desencontrado, desembaraçado, com excesso de verve nos seus comentários fazendo a língua de Camões sofrer mudanças extremas, no seu entusiasmo que levava os ouvintes alvoroçados de alegria.
Com tais características, Cizota era um dos oradores mais solicitados nos comícios, inaugurações e qualquer aglomeração festiva, para utilizar seu palavreado e cativar a atenção dos audientes.
Em qualquer oportunidade do seu dia a dia, gostava de citar os nomes de seus amigos importantes e costumava destacar o governador Gonzaga Mota (Luiz de Gonzaga Fonseca Mota), que foi o primeiro dignatário do Ceará durante as secas de 1983 e 1984, passando pelas enchentes de 1985, concluindo o seu mandato em 1987.
Visitou várias vezes o Icó, desde a campanha de 1982 e após eleito, em algumas inaugurações, dentre elas, em outubro de 1986 a da Praça de Esportes Francisco de Assis Tavares, onde o prefeito Aldo Marcozzi homenageia o filho do Cizota.
As circunstâncias fizeram, de fato, essa amizade. O governador Gonzaga sempre foi extremamente humilde no tratamento com as pessoas sem descaracterizar seu perfil de gestor eficiente que, numa destemida e republicana decisão, rompeu com o presidente João Figueiredo para apoiar Tancredo Neves na disputa, em 1984, à presidência da República, na época marcante da redemocratização do país.
Para a felicidade de um das mais populares figuras pitorescas icoenses, o carcereiro Cizota, o governador Totó nunca rompeu o acordo de amizade com o mesmo.
O carcereiro policial em questão, responsável ou irresponsável pela legitimização do preso e pela condução, quando necessário, e sua guarda, até a sua aposentadoria continuou no Icó aumentando cada vez mais a sua popularidade, convidado obrigatório para as discussões mais polêmicas sobre qualquer assunto e disponível para passeios à Fortaleza caso aparecesse um patrocinador da viagem.
Numa dessas viagens à capital, Cizota foi recebido no Palácio da Abolição, pelo governador que guardava as lembranças das campanhas políticas, na “festa do interior”, com a peculiar simplicidade que o caracteriza, tratando-o como “velhos amigos”, conversaram, com direito à rodada de café e complementos quando o visitante informou que já estava com a passagem de ônibus para regressar ao Icó logo mais tarde.
A maior autoridade do Estado chamou o ajudante de ordens para providenciar um carro e deixá-lo na estação rodoviária, com todos os aparatos de visitante ilustre, aperto de mão, tapinha nas costas, tudo o que tinha direito.
A conversa alegre se fundamentava nas despedidas, e ao que parece, o Governador já estava convicto de ter sido um bom anfitrião e precisava retornar às suas laborações, sem antes receber um aviso de adeuses do Cizota:
- E a “mufunfa” não vai ter?
O amigão atendeu de pronto, meteu a mão no bolso e entregou uma nota que foi guardada nos cós da calça para evitar os surrupiadores do alheio, com suas mãos ágeis, venham a surpreendê-lo na rodoviária após a despedida da segurança palaciana.
Por Gilson Moreira (extraído do livro: "Fatos Pitorescos da Ribeira dos Icós e outras Ribeiras”).
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