No antigo mercado público da princesa dos sertões, comumente conhecido como “Mercado Velho” , construído nos finais do século XIX, em 1875, um bem histórico tombado e relativamente preservado, funcionou por vinte e dois anos o célebre “Café da Zilá”.
Fala-se “Café da Zilá”, mas na verdade, tem comida para todos os gostos, passando pela panelada, buchada, cozidão e finaliza com o cafezinho, sendo este, sem valor comercial, logo os habituais frequentadores, sem cerimônias, vão diretamente na garrafa e coloca o líquido precioso na xícara e até “fazendo cortesia com o chapéu dos outros”, oferecendo à pessoa que está ao lado no momento do autoatendimento.
Isso mesmo, o ditado popular cuja origem se deu quando era comum as pessoas cobrirem a cabeça com um chapéu como marca de fino trato e costumava-se tirar o chapéu quando se cumprimentava uma mulher ou alguém digno de respeito.
Daí nasce a frase “Fulano fez cortesia com o chapéu alheio”, isso, toda vez que se usava um chapéu que não era o seu, ou seja, fulano apoderou-se daquilo que ele não detinha, não tinha mérito, enfim, não conseguiu e deveria ter a dignidade de não fazê-lo.
A estimada Maria Zilá da Silva, popularmente Zilá do Café, afamada pelo bom tempero, no entanto, muito mais pela “língua solta”, ou seja, indiscreta, que fala demais sobre a vida alheia, caso seja provocada; então fala o que vem à cabeça, fala o que não deve ou que deve ou demais, nada a inibe com a sua autenticidade e sempre preparada com uma resposta “delicada” para qualquer pergunta ou palpite, em algo relacionado ao seu território.
Aluízio Costa, ou melhor, Aluízio de Geraldo Vandega, famoso eletricista e freqüentador assíduo, era conhecidíssimo também pela sua “delicadeza” e por instigar a gestora do estabelecimento a emitir pronunciamentos “elogiosos”.
Após concluir um trabalho em horário tardio resolveu ir almoçar e chegou quando havia passado a hora do “rush” e os demais frequentadores já haviam saído para o trabalho ou ao cochilo após o almoço, a hora da sesta, tão costumeira no sertão, como instinto natural do organismo.
Presentes no espaço de alimentação apenas o Aluízio Badalo e a dona do cafezinho, a famosíssima Zilá, tão renomada pela sua constante “amabilidade”.
O freguês cotidiano, possivelmente, na intenção de puxar alguma conversa e estando diante da garrafa de café, iniciou o amistoso a seguir:
- Zilá, quer um cafezinho?
- Por que você está me oferecendo cafezinho?
- Eu vou tomar agora e posso te servir.
- A garrafa taí quando quiser eu mesmo boto, não preciso de você pra me servir não.
E assim ficou concluído mais um bate-papo habitual no famoso cafezinho da Zilá, que por vinte e dois anos permaneceu ativamente e muito bem frequentado a partir dos primeiros raios, momento imediatamente anterior ao nascer do astro-rei, em que apenas o céu se ilumina e um selecionado, mas, bem representativo grupo de senhores da sociedade saudavam o alvorecer.
No entanto, muitos precisam conhecer a Zilá em uma outra perspectiva, uma cidadã nascida, criada e falecida no Icó, o seu grande universo. Veio ao mundo em 1928 e registrada foi Maria Zilá da Silva, sempre dedicada ao trabalho, como acima citado, só no “Café da Zilá” foram vinte e dois anos no mercado velho.
Mãe dedicada de filho único, Cícero, a quem concentrou os seus esforços para que ele tivesse o que a ela não foi proporcionada: a educação.
A conversa de mãe e filho era que a ela cabia trabalhar e a ele estudar e se formar.
A nossa querida Zilá veio a falecer em 15 de junho de 1991, aos sessenta e três anos de idade, deixando com vinte e oito anos, o único descendente: Dr Cícero Alves da Silva, bacharel em Pedagogia, trabalha no Ministério da Saúde, atualmente aos cinquenta e oito anos de idade, casado com Maria Lúcia de Oliveira Moura da Silva, que deram três netos à Zilá:
- Josué Henrique Moura da Silva, 35 anos, economista de sistemas; Ana Cecília Moura da Silva, 32 anos, médica-pediatra, e José Tibério Moura da Silva – fisioterapeuta.
Cinco netos completam a árvore genealógica tendo como matriarca a Dona Zilá, que na eternidade está sorrindo pelo dever cumprido e pelas inúmeras trocas de desaforos com os clientes insultantes para exatamente ouvir as farpas que invariavelmente sabiam que iam receber.
Por Gilson Moreira (extraído do livro: “Fatos Pitorescos da Ribeira dos Icós e outras Ribeiras”).
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