O voto impresso, tão debatido nos últimos dias como massa de manobra liderada pelo presidente Jair Bolsonaro nas redes sociais, sempre foi na prática motivo de muitas fraudes e reclamações.
Primeiro pela condução das urnas, pois os votos eram transportados de todos os recantos - do sertão à cidade - a sede dos Cartórios Eleitorais. Guardados em sacos de lonas marrons desgastados pelo tempo.
Segundo muitas fraudes eram também registradas nas transcrições dos somatórios dos votos para os mapas eleitorais, onde uma equipe sem qualquer fiscalização fazia o trabalho ao seu bel prazer.
Em uma única urna por exemplo, em 1986, ao ser recontada por imposição de um advogado do PMDB, um candidato a deputado estadual perdeu mais de cem votos que foram a ele graciosamente listados somente no mapa.
E tem casos hilários, como também do bom folclore que nos remete ao voto impresso que dele não temos qualquer saudade, a não ser os lunáticos que embevecidos pelo facismo, já procuram uma desculpa a iminente derrota em 2022.
Pois bem, meu querido amigo Chico de Manduca, sempre teve expressivas votações a vereador em Icó. E nas eleições de 1992, ele estava mais forte do que nunca, principalmente nas regiões do São Vicente (Catavento), Cruzeirinho e Perímetro Irrigado.
Lembro bem que apurava-se uma urna no Cruzeirinho, onde Chico obteve 60% dos votos, mas quando foram ler no mapa eleitoral praticamente os seus votos sumiram.
Reclamou para a Juíza e, após aferir a denúncia, a Magistrada afirmou que ele tinha razão e que de fato ocorreu na prática uma grande fraude.
Chico, sempre muito educado, cuidou de explicar:
- "Doutora, não estou aqui pra brigar com ninguém, muito menos com a Justiça que sempre respeitei. Mas resolvi reclamar e a senhora viu que eu tenho razão, pois é a mesma coisa de eu ver alguém roubando as minhas ovelhas do quintal e ficar calado como se nada estivesse acontecendo".
Mais adiante, isso também na apuração dos votos das eleições, que se realizava por vários dias na sede do Cabana Clube de Icó, chega uma urna cheia da comunidade do Catavento.
E naquela localidade, há décadas, dois líderes disputavam voto a voto: Chico de Manduca e Chico Nunes.
Fazendeiros e líderes políticos muito respeitados até os dias atuais em nossa cidade; não fazem mais parte da vida pública, mas seguem vivos e fortes nos livros da história.
Inicia a apuração dos votos impressos.
Contados quarenta votos escritos apenas por "Chico". Daí inicia uma peleja pela paternidade dos votos.
- "SÃO TODOS MEUS", bradou Chico de Manduca.
- "NÃO SENHOR, ESTES VOTOS SÃO MEUS", protestou Chico Nunes.
Até que entraram em um acordo: vinte votos serão inscritos no mapa pra Chico de Manduca. E os outros vinte votos serão inscritos pra Chico Nunes.
Os ânimos se acalmaram, à época, mas como vocês podem observar o voto impresso é o que existiu de mais arcaico e imoral na recente história da política brasileira.
(Por Fabrício Moreira da Costa, advogado, contista e ex vice-prefeito de Icó).
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